Dezembro
chegou para ele como um agiota – como quem pega de volta o saldo sem se
preocupar com o prejuízo. O mês levou-lhe as calças e tudo mais. Cobrou sua
dignidade. Desde o dia primeiro já se cansava das listas. Por ter aparência estável,
de boa renda e bom coração, ninguém lhe esperava ‘não’. O senhor pode, você
quer, seria uma honra. Uma dívida é medida por concordâncias. Aceitou tudo que
o destino lhe dera, como que por osmose, ainda que não fosse muito. E deu tudo
à vida, distraidamente. Em meados do mês teve ciência das apostas que fez ao
longo do ano. A resposta é demorada e súbita, tudo ao mesmo tempo. Por razões
que desconhecia, perdeu a mulher e o negócio. Voltou para a família. É sempre
estranho quem volta para a família, isso porque a família incute um sentimento
de culpa no sujeito, como quem avisa antes do resultado e depois relembra o
conselho. Coitado, eu avisei. Pois bem. O sujeito que parecia ter tudo e não
tinha nada não se contentava em perder. Perdia e perdia. O natal era pra ele
uma desculpa para encher a cara – Dionísio nasceu no mesmo dia que Jesus, vinte
e cinco. Por isso afirmava que o crédito era de Baco, e não de
Cristo. Sobre presentes, relevava. Havia um dispêndio compulsivo em seu ser, algo
que não era próprio, mas do sangue, uma necessidade efusiva de gastar o que já
não era mais dele, como o tempo, como o amor. Dos males divinos, o sangue é o
pior deles. O fator sanguíneo extingue a chance de escolha, distribui aleatoriamente
os aliados, os vencíveis e os invencíveis, dizendo quão grande são os
obstáculos afins do destino. O espírito natalino era uma máscara, um remédio
que disfarçasse todo o estrago dos meses anteriores. Dezembro era, sobretudo, uma
dúvida.
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